24 de dezembro de 2009

Os milagres do Natal



Tempos atrás atendi uma paciente de 10 anos que, segundo sua mãe, era “muito tímida”. Suas professoras me alertaram, “ela é muito fechada”. Na verdade, a menina sofria de mutismo. Mas não era um mutismo em que ocorrem tentativas de comunicação por gestos ou alguns escassos sons. O mutismo da menina era seletivo. Com exceção de seu pai e sua mãe, ela nunca havia falado com adultos. Com os colegas de classe ela interagia, brincava, fazia bagunça em aula. E falava. Falava muito. A ponto de receber anotações na caderneta endereçadas à mãe.

O início da análise da menina foi um desafio para mim. Além da recusa em falar, ela não queria estar ali. Aos poucos, e com muito manejo, a comunicação foi acontecendo. Certa vez, com a proximidade do Natal, durante a sessão e quase como um suspiro, ela me diz:
- Você não sabe o que eu tô pensando.
-Não, não sei. Mas você pode me falar.
E ela me pergunta:
- Você acredita em milagre?

O que me autorizo a narrar sobre esse atendimento, encerra aqui. Hoje me coloco frente à essa pergunta e digo: sim, eu acredito em milagre. Mas, sobretudo, acredito no milagre da superação, na perseverança e no trabalho feito com dedicação e cuidado.

Acredito também que nenhuma situação difícil que se esteja atravessando é definitiva. Ou que seja “coisa do destino”. A vida é dinâmica e é isso que faz dela um grande milagre.

Desejo à todos uma noite de Natal muito feliz. E que esse momento de paz e união seja o milagre de todos os dias.


21 de dezembro de 2009

"Espelho, espelho meu"




Em novembro de 2009 essa entrevista foi concedida à Rosane di Napoli para a revista Gossip Teen a respeito da anorexia, bulimia e, tão comentada na atualidade, drunkorexia. Muito esclarecedora. Leiam!

clique aqui para ler a matéria

17 de dezembro de 2009

Sofrimento psíquico do desempregado




Quando se fala em saúde subentende-se a manutenção de certos hábitos na vida cotidiana. Ginástica, alimentação adequada, um número razoável de horas de sono à noite. Mas o que dizer quando a condição psíquica é avassaladora? Além da questão financeira, repercussões graves surgem no mercado de trabalho e poucas são as empresas que de forma coerente 'desligam' seus funcionários. A situação do desempregado envolve questões legais e profissionais e muitos possuem, além da urgência, a insegurança de se lançarem no mercado exercendo uma função diferente.

A (des) ordem conjugal e/ou familiar compromete o desempenho escolar dos filhos que sofrem com o ambiente doméstico ou com mudanças inesperadas de colégio e consequente círculo de amizades. A necessidade de mudar de bairro ou cidade por conta de uma situação financeira incerta causa uma dificuldade de entrosamento em um novo grupo. O vazio existencial sofrido pelo desempregado é gerado por uma grande perda de auto estima, fragilidade financeira e a incerteza do mercado de trabalho. Sentimentos que irão refletir na dinâmica familiar. O parceiro pode sentir-se sobrecarregado e solitário com tantas responsabilidades. Todos são afetados.

Em outros casos, pessoas que durante anos dedicaram-se de forma exclusiva à profissão e abdicaram de um vínculo conjugal ou que por outras razões não conseguiram fortalecer seus laços familiares, mantendo seus vínculos mais fortes no ambiente de trabalho, sentem-se órfãs e desamparadas no momento em que são demitidas. 

O trabalho é via de acesso para o lugar que o sujeito vai ocupar na família e na sociedade levando-o a acreditar que será reconhecido se ele produzir. Os sentimentos de fracasso e exclusão afetam o desempregado em suas relações afetivas e, visto que o trabalho é uma forma de subjetivação e inserção social, a falta de reconhecimento dentro do meio em que vive pode vir a ocasionar doenças psicossomáticas.

Os que trabalham excessivamente, os chamados ‘workaholics’, tem papel social marcante, mas a preocupação sobre a saúde do desempregado ainda caminha lentamente.

Aqueles que sofrem psiquicamente com a situação de desemprego sentem-se comprometidos moralmente pela exclusão e dificuldade de uma nova colocação, porém o entendimento de ‘estar desempregado’ diz respeito à uma condição transitória e não é sinônimo de ‘não-ser trabalhador’.

10 de dezembro de 2009

O tímido



Costuma-se dizer que o tímido é aquele que não tem autoestima, não se valoriza. Ou que é antipático e não “se dá” com ninguém. Ou então não é muito inteligente, social, atraente... E, portanto, se retrai e não interage com o grupo. Com nenhum grupo. Alguns tímidos vivem uma realidade paralela com o mundo virtual. A internet cria uma nova modalidade de relacionamento que funciona ilusoriamente como facilitadora das relações e, na contra mão, potencializa a dificuldade do tímido.

Cada um tem suas próprias razões para justificar uma dificuldade, mas, de uma forma geral, o tímido sofre com a possibilidade de se expor, ser julgado e, nessa fantasia, condenado pelo ato mais inofensivo.

O medo transbordante se apresenta com palpitação, suor, rubor, calor, frio e, algumas vezes, desmaio. A exposição e a possibilidade de fracassar ou ser ridicularizado fazem com que o tímido mantenha-se engessado nessa condição. Sofrendo por antecipação, consegue criar fantasias em que se coloca de forma inferiorizada ou humilhante. Em geral possui um (a) amigo (a) que lhe serve de “contato com o mundo” evitando que iniciativas sejam tomadas e, portanto, situações de avaliação ou julgamento não ocorram.

Ele é capaz (e muito!) por conta de seu isolamento ter um grande conhecimento em assuntos variados e, no entanto, ser considerado aquém de suas reais possibilidades em virtude do seu recolhimento e do medo em ser percebido pelos outros. Quando em idade escolar tiram notas muito acima da média e alcançam excelentes colocações em vestibulares e concursos.
São os “nerds”.

Afirmar que o tímido é um covarde seria uma forma reducionista de perceber um conflito que pode evoluir para uma condição mais grave. Ele se resguarda porque já sofreu com a represália, o repúdio e sabe o quanto doeu e ainda dói mesmo que inconscientemente. Tudo aquilo retorna como algo conhecido e, então, trava uma guerra interna desejando dar um passo à frente sem conseguir. A psicanálise é um recurso que tenta desdobrar as diversas atitudes atribuídas à um sujeito atrelado em um mundo repleto de resistências.


7 de dezembro de 2009

Indicação de atendimento psicoterápico gratuito

Tenho recebido emails pedindo informações sobre clínicas de atendimento psicoterápico gratuito ou com preços reduzidos. No Rio de Janeiro indico em duas universidades:

Universidade Veiga de Almeida

Clínica de Psicologia (Tijuca)
Rua Ibituruna, 108
Vila Universitária - Casa 4
Tel: 2574-8898

Clínica de Psicologia (Barra)
Av General Felicíssimo Cardoso, 500
Tel: 3325-2333 ramal 146

PUC - Serviço de Psicologia Aplicada (SPA)
Rua Marques de São Vicente, 225
Gávea
Tel: 3527-1574

Em outras localidades recomendo que procurem os serviços de psicologia aplicada das universidades.
Boa sorte.

Brincadeira de pais e filhos

A idéia de que a brincadeira é essencial para o desenvolvimento ainda encontra resistência. O momento de brincar é fundamental no processo de desenvolvimento. A brincadeira constitui-se um importante espaço onde ocorrem trocas de informações onde é criado um mundo de ilusões e verdades por meio de símbolos vivenciando momentos de alegria, satisfações e angústias inomináveis. Nesse momento único a criança pode se desvelar e nessa experiência lúdica aprende a solucionar situações de conflito. O dimensionamento dessas questões cria a possibilidade de um adulto mais organizado, capaz de saber lidar com o inesperado, tratando com mais habilidade todo tipo de dificuldades. 

Neil Postman em seu livro ‘O desaparecimento da infância’ (Ed. Graphia, 1998) sustenta a tese de que as crianças nos dias atuais estejam perdendo a espontaneidade de brincar livremente. De fato com a imposição consumista do mundo cibernético, as crianças encontram dificuldade para brincarem e serem, eles mesmos, os ‘agentes’ e inventores de suas próprias fantasias. A infância não está desaparecendo. Com incentivo do meio em que vive, a grande maioria das crianças é capaz de exercitar sua capacidade de apreender a noção de posse do objeto, a introjeção de valores fundamentais e sentimentos de frustração, perdas e conseqüente superação. 

O atual estilo de vida provoca um término prematuro da infância. Deixa-se de ser criança mais cedo. O acesso à todo tipo de informação, desnecessária à tenra idade, a possibilidade eletrônica do brincar e a ameaça urbana impedindo a ‘brincadeira de rua’ não somente aprisionam a criança em seu território doméstico, como também subjetivamente criando entraves em seu desenvolvimento. A dificuldade dos pais em conciliar horários, tarefas e partir, então, para a brincadeira com os filhos, cria uma distância onde um não se reconhece no olhar do outro. A criança acaba desenvolvendo recursos próprios ou sai em busca de um auxílio externo, fazendo com que o abismo fique ainda maior na relação com os pais. Tornar o escasso convívio em momento de alegria é extremamente importante no universo psíquico da criança, mas à essa vivência devem ser agregados os questionamentos próprios de cada idade.

4 de dezembro de 2009

Você tem resiliência?



O termo vem da Física e, segundo o dicionário Aurélio, consiste na propriedade pela qual a energia armazenada em um corpo deformado é devolvida quando cessa a tensão causadora de uma deformação elástica. Ou seja, o material volta à sua forma original depois da tensão sofrida.



Em psicologia é a capacidade de superação e crescimento mesmo diante da adversidade. Sempre conhecemos alguém que trabalha e mesmo assim vive em um orçamento apertado, outro cria filhos sozinho, enfrenta falência, desemprego, doença e ainda assim parecem estar bem e conseguem ultrapassar obstáculos.

Resiliência não diz respeito a um trauma maior ou menor, pois isso criaria uma escala de sofrimento. E dor não se quantifica. Algumas pessoas resistem à morte de um filho e, no entanto, outras dão fim a própria vida quando são demitidas do trabalho. Portanto, resiliência diz respeito a uma reflexão sofre a vida no momento de um trauma.

O sofrimento é inevitável, porém a capacidade de enfrentar as questões é que permite a superação de um trauma.

Os primeiros anos de vida podem definir a capacidade resiliente. O ambiente em que a criança vive determina as condições futuras de um adulto confiante, pronto a superar dificuldades e criativo no que se refere a alternativas quando tudo parece não acontecer como esperado.

A criança que recebe de seus pais uma resposta favorável diante das adversidades e insucessos prossegue confiante em seu desenvolvimento. Esse não é o caso de ser condescendente com atitudes antisociais como furtos, transgressões morais ou excessos de vontades satisfeitas. Importante também ressaltar que o conceito de família diz respeito ao meio social em que a criança estava inserida. Um abrigo infantil filiado à uma ONG ou uma família que recebe a criança por um longo período, muitas vezes proporciona um acolhimento bastante diferente da família de origem de uma criança que tenha sofrido violência e maus tratos, por exemplo. O mesmo acontece com crianças órfãs que dividem o mesmo espaço com cuidadores responsáveis. Mas essas condições nem sempre estão presentes. 

Alguns conseguem superar as dificuldades e restaurar simbolicamente uma família perfeita com seus recursos internos, independente das adversidades familiares e sociais. E nessa tentativa de superação não há espaço para o papel de vitima e descobre-se, então, forças para reagir negando a si mesmo o sofrimento que lhe é infligido. Um excesso de humor frente às dificuldades, também é uma forma de tentar modificar o próprio cenário, criando condições para enfrentar o mundo e preservar a própria imagem .

Portanto os fatores que criam condições para que o sujeito tenha resiliência possui tanta plasticidade quanto o próprio conceito.

Acredito que a eureca para ser resiliente consiste em uma só competência. Criatividade. Ter jogo de cintura para sair do impasse, do sofrimento e da dúvida. Encontrar novas maneiras de lidar com situações difíceis e se reorganizar.

O mais importante é saber que por trás de um conceito nobre e de toda essa potência humana pode existir um sujeito destruído emocionalmente. Mas que tenta se superar e traçar uma nova história.
        

9 de novembro de 2009

Sexo na terceira idade





A dificuldade em aceitar a idéia do sexo na maturidade era grande. Essa mudança provavelmente é o resultado da condição sócio econômica modificada, o aumento da longevidade, o avanço de uma ampla gama de medicamentos e tratamentos, além de toda a tecnologia de aparelhos médicos capazes de detectar anormalidades no corpo com muita antecedência. Fora isso, a possibilidade de se discutir sobre o sexo tornou-se possível e natural. A vida sexual do idoso foi “estimulada” com a descoberta de medicamentos facilitadores do desempenho no momento da relação sexual. Além disso, um maior esclarecimento da vida sexual foi surgindo. Tempos atrás o papel social do idoso resultava em determinado perfil psicológico que mais se aproximava à um estigma.
O estigma, sendo marca que as outras pessoas colocam sobre alguém é tarefa difícil de se libertar. A pessoa na terceira idade carrega alguns:

* De um Ser Superior. Alguém cuja figura é norteadora da organização familiar o qual todos buscam para alguma orientação e prestam reverência. Está acima de todos os membros da família. É dominante e dominador.
* Outra vezes o idoso é percebido como uma pessoa doente. Sempre adoecido (alguém serve de porta voz para anunciar que “ele hoje não está bem”) forma-se um revezamento para levá-lo ao médico e à exames a maior parte do tempo e adota-se uma postura maternal frente à ele, infantilizando-o. Condição que irá certamente dessexualizá-lo.
*Finalmente e não menos importante, o idoso assanhado. Que muitas pessoas referem-se como “velho tarado” e que “fala muita bobagem”, quando na verdade a pessoa pode estar sendo acometida por uma senilidade ou querendo simplesmente fazer graça para chamar um pouco de atenção e assim demanda amor.

Em qualquer das três situações o idoso poderá criar a sua identidade. Irá assumir o perfil proposto para ele. Por pertencerem à outras gerações, algumas vezes trazem na própria experiência de vida, a herança cultural de que deveriam cumprir o seu papel dentro da vida conjugal. E quando um deles se confronta com a perda definitiva de seu parceiro a situação se complica. Além da questão da perda, em ter de atravessar o luto pelo ente querido o qual conviveu por tantos anos, ele terá a difícil tarefa de criar condições para reiniciar a vida e estabelecer novas relações de afeto.

Libertar-se de um estigma não é fácil. E muitas vezes por conta da carência de atenção dos familiares ou pelo medo de ficar só, o idoso ”veste” um desses perfis para ter o carinho do outro.


Criando-se uma grande distância, quando é considerado o patriarca (ou matriarca); ou tratando-o como um ser permanentemente adoecido e infantilizando-o; ou sendo motivo de piada e achando graça em tudo o que ele faz, a questão é que o idoso deve ter acesso à um ambiente favorecedor de relações verdadeiras sendo reconhecido em sua maturidade e respeitado pela sua condição. A psicoterapia bem conduzida pode ajudá-lo a criar recursos internos para que se sinta valorizado e acreditando estar apto à viver uma vida sexual plenamente.

6 de novembro de 2009

Dor física e violência psíquica



As mulheres vítimas de violência são menos resistentes à dor. Essa afirmação foi feita à partir de uma pesquisa em um hospital nos Estados Unidos e publicado na Medscape, site internacional de publicações médicas. Além da dificuldade em tolerar a dor no corpo, apresentam um persistente estado depressivo e muitas possuem tendência ao suicídio e ao sexo sem proteção. Nos Estados Unidos 40% das mulheres entre 18 e 64 anos já passaram por pelo menos uma experiência de violência seja abuso sexual na infância, estupro ou espancamento. No Brasil a situação não é muito diferente. A cada 4 minutos uma mulher é agredida dentro ou fora de casa por alguém com quem possui relação de afeto. Passam então a sentir dores por toda a vida sem conseguirem chegar à um diagnóstico final que explique sua origem.

A fibromialgia, por exemplo, doença caracterizada por dores generalizadas na coluna e no corpo associada a cansaço permanente e depressão, aponta que 10% das mulheres que apresentavam essa doença haviam sido vítimas de abuso sexual. O agravante de toda essa situação é que apenas um terço das mulheres conta para o médico terem sofrido algum tipo de abuso. A maioria não revela o passado de violência por medo e principalmente vergonha. Um tratamento eficaz se estabelece na confiança depositada no médico, pois ele poderá diagnosticar que a doença física tem sua origem em um sofrimento psíquico podendo prescrever ao paciente antidepressivos e tratamento psicoterápico.

1 de outubro de 2009

Criando filhos, criando netos.

Email recebido de uma leitora:

“Tenho 52 anos de idade, sou viúva há 8 anos...agora que estou mais conformada, pensei que iria ter um pouco de tranqüilidade na vida e me enganei...minha filha tem 22 anos, mora comigo e tem um filho de 5 anos de idade. Ela não quer saber de nada, o pai da criança muito menos. Sobra tudo para mim e o que é pior. Ela não faz nada o dia inteiro, não cuida do menino, não faz uma comida, nada. Quem faz tudo sou eu. Ela dorme o dia inteiro e a noite ela sai. Outro dia o menino foi com a blusa do colégio suja do dia anterior porque ela não tinha lavado. Estavam todas sujas. Nem para colocar na máquina e apertar o botão ela presta. Eu fiquei com dó do menino porque eu o amo muito e ele não tem culpa da mãe que tem. Como pode uma mãe não querer saber do filho? Outro dia cheguei em casa às 9 da noite e o menino ainda não tinha jantado. Quando ela engravidou, ela e o namorado disseram que iriam assumir a criança. 5 anos depois ninguém ainda assumiu nada. Quem assume sou eu. Tenho vontade de botar ela para fora de casa mas penso no meu neto e tenho medo de que a doida da mãe dele deixe alguma coisa acontecer e eu me sentir culpada. O que é que eu faço?”

Existe uma lenda a respeito da maternidade e da maternagem. Essas duas condições não estão necessariamente interligadas. Ter um filho não desperta automaticamente a capacidade de lidar com ele na pura essência do que isso envolve ou seja dar amor, cuidado e tudo o mais que uma criança necessita. Muitos homens cumprem de forma muito eficiente es
sa função. A maternagem não diz respeito exclusivamente às mulheres e tampouco à própria mãe da criança. Haja vista que homens e mulheres adotam crianças e em muitos casos adaptam-se bem às todas as demandas e exercitam a maternagem de forma bastante eficiente. Portanto não é também uma questão biológica. Ou mesmo casais que optaram em abrir mão temporariamente do trabalho do homem, ficando este em casa cuidando dos filhos. Este padrão é visto com freqüência em países desenvolvidos. Ou avós que, cada vez com maior incidência, cuidam de seus netos pelas mais diversas questões.

No seu caso, acredito que o melhor a fazer é assumir uma posição. Parece que v
ocê se preocupa muito com seu neto e tudo o mais que o cerca. Se sua filha não se posiciona em relação à própria vida, cabe a você tomar uma atitude. E se o seu neto é uma pessoa importante para você, integre-o à sua vida de forma completa e exija um posicionamento da sua filha que já tem idade suficiente para lidar com as próprias dificuldades. De nada adianta um bate boca a respeito de uma situação bastante conhecida e, ao mesmo tempo, continuar endossando o tipo de conduta que ela vem adotando rotineiramente. Tenha uma conversa franca com ela, exponha as suas intenções em relação ao menino e faça o melhor por ele. Talvez apenas uma conversa não seja suficiente. Insista e em algum momento exija novamente um posicionamento. Responsabilize-a pela própria vida assim como com a vida do seu neto. Acredito que o mais importante é ensinar à sua filha que na vida existem sempre várias opções para lidar com uma mesma situação e que somos responsáveis tanto pelo que fazemos como também pelo que deixamos de fazer. Com o meu melhor abraço.

8 de agosto de 2009

Adoção




Muito se tem mostrado sobre a adoção na atualidade. Uma febre fashion que parece ter contornos bastante próprios à uma minoria onde são excluídos seus entraves subjetivos. Tudo como fator compensatório para a realização de um desejo.

O que leva uma pessoa a querer agregar à sua própria vida um outro desconhecido que irá depender integralmente dentro de um processo dramático bastante diferente do que é anunciado? A adoção marca a vida de todos os envolvidos no processo muitas vezes de forma mais intensa e dolorosa que as dores do parto. Ao contrário dos manuais de conduta e averiguação das possibilidades de quem adota, os inúmeros motivos que levam à adoção são os que certamente mais interferem nessa difícil relação. Brevemente destacarei duas formas de luto como possibilidade para a decisão da adoção. Como substituição de um filho biológico que não virá em decorrência da esterilidade do casal ou de um dos parceiros e como tentativa de superação do luto de um filho morto buscando na adoção a possibilidade de "dar a luz" novamente.

A ferida narcísica de um casal frente à impossibilidade de se realizarem pela concepção biológica conduz à decisão da adoção como saída para a relização de um desejo. Porém um emaranhado de sentimentos irá permear a triangulação. Vivendo à sombra da lembrança da impossibilidade biológica do casal, o adotado também poderá promover a cessação de uma infertilidade transitória.

Em outros casos a adoção surge como possibilidade de substituição de um filho morto criando uma constante comparação e possível ódio inconsciente em relação ao adotado fazendo com que lhe seja impossível corresponder à uma forte demanda dos pais adotivos. Uma modificação do Ideal do Ego se faz necessária no desejo da adoção. Sentimentos inconscientes de culpa em memória ao filho morto e a ameaça de perda do filho adotado frente à fantasia de ressurgimento dos pais biológicos podem dificultar a relação dos pais nesse processo.

Um filho na maioria das vezes representa a extensão de uma relação, o desejo mútuo de prolongamento dos vínculos e troca biológica do casal dando continuidade à esses afetos. A filiação simbólica faz parte do processo da construção subjetiva de cada um e não somente daqueles envolvidos biologicamente fazendo então com que a adoção seja possível e venha a criar fortes laços parentais mediante cautela e conhecimento do lugar que o filho irá ocupar no desejo do casal.













16 de julho de 2009

Solidão day by day


Existe um contingente que cresce a cada dia formado por pessoas que decidiram morar só e cada qual com seu argumento transformou essa opção em estilo de vida. Aproximadamente 4 milhões de brasileiros decidiram morar sozinhos. Na verdade viver só tornou-se uma tendência mundial e em geral são pessoas independentes que se instalaram em lares confortáveis onde muitas vezes revelam uma autosuficiência operacional e emocional desconcertantes para quem tenta se aproximar, afirmando não gostarem de “problemas”, que é “ótimo viver sozinho e não precisar dar satisfação à ninguém”. Possuem prontamente uma grande lista de vantagens em se ESTAR sozinho em casa. A maioria de ordem prática tais como assistir ao que desejam na televisão, organizar e bagunçar a casa sem ouvir reclamação e a lista continua bastante longa com poucas variações. Mais adiante se começa a perceber um tom um pouco mais triste e preocupante frente à solidão pela ameaça em haver optado por viver só e esse fato tornar-se uma sentença para toda a vida.

SER sozinho é diferente. Há um sentimento angustiante escondido e permanente. Afinal confrontar-se com o próprio silêncio não é muito fácil. Em perceber que o telefone não toca. Ou a possibilidade de escorregar no chuveiro e bater com a cabeça. E a pior de todas. E se eu morrer sozinho??? Para morrer não é necessário um parceiro ao lado, mas perceber a falta de reconhecimento de alguém em sentir a nossa falta traz um sentimento de desvalia difícil de driblar. É o momento em que a auto estima é abalada à elevados níveis.

“...o fato de não ser amado reduz os sentimentos de auto estima, enquanto que o de ser amado os aumenta. ... uma pessoa apaixonada é humilde. Um indivíduo que ama priva-se, por assim dizer, de uma parte de seu narcisismo, que só pode ser substituída pelo amor de outra pessoa por ele. Sob todos esses aspectos, a auto estima parece ficar relacionada com o elemento narcisista do amor.” (Freud, Sobre o Narcisismo, 1914)

Portanto dependemos do outro para nos reconhecermos como indivíduos e nos sentirmos amados. A ausência de interesse em não dividir a vida ou a casa e o excesso de apego material promovem um distanciamento dificultando as relações. Algum sentimento de pesar em datas importantes no calendário e um sentimento de fracasso em ver os amigos do mesmo círculo de amizades constituindo família fazem com que em muitos casos a solidão esteja além de uma escolha pessoal. Pode atrapalhar a vida e cada vez mais dificultar as relações.


10 de julho de 2009

Um breve conto homossexual

Talvez eu devesse explicar de antemão o que se trata aqui. Um email recebido de uma mulher de 32 anos falando sobre suas certezas e, segundo ela, muitas dúvidas acerca de relacionamentos e sexualidade. O nome é fictício e reproduzirei algumas partes do email que me inspirou escrever esse conto.


Joyce, a questão consultada foi enviada para sua caixa postal.
Um abraço.

O email: "Vivi minhas primeiras atrações e desejos na época da adolescência...sonhava com o príncipe...mas me sentia atraída por aqueles que possuíam um aspecto feminino...ou algum traço, jeito...de sacudir os cabelos que me lembrasse uma mulher. Minha primeira experiência sexual com um homem foi um desastre...conheci uma mulher mais velha...me fez a mais linda declaração de amor...debutei em meus amores homossexuais..."

O conto: "Meu nome é Joyce. Tenho 32 anos, vivo nessa eterna condição limítrofe e pareço uma ninfa de mármore em um divisor de águas. Assim... Vivi meus primeiros desejos adolescentes, incandescentes, como toda jovem de minha idade. Sonhava também com o príncipe encantado. Sentia-me, portanto, agitada e muito atraída pelos meninos. Mas percebia que aqueles que me atraíam, tinham algo de feminino, um traço, um sorriso, o jeito de sacudir a cabeça e jogar o cabelo para trás. E essa era a parte que eu mais gostava. A dúvida em saber quem de fato estava ali. Ele ou ela. Menino ou menina. Minha desastrosa primeira experiência sexual foi com um homem bem mais velho. Achei que passaria por esse ritual iniciático e seguiria com a minha vida sem incômodos buscando minha identidade sexual. O outro lado da minha moeda. Terrível. Sem comentários. Mas aos 18 anos uma mulher fez a mais linda declaração de amor que eu havia recebido até aquele momento. Malditas palavras. Ela era diferente. Diferente de mim, de tudo. Sofisticada, tinha um ar de superioridade, algo blasée que escravizava todos nesse olhar. E em meio à uma música hipnótica e círculos de fumaça ela me diria "I'm at heart a gentleman", como Marlene Dietrich. Ali foi o início de meus amores homossexuais.

Hoje entre idas e (bem) vindas e depois de uma ruptura às vésperas do dia dos namorados (e das namoradas!) faço o balanço da minha vida e constato com certo temor que minha identidade é dissociada entre uma parte feminina e outra masculina. Parece que a minha crise de meia idade é precoce. Sim, sim...Tenho ido à um psicanalista. Indicaram um tal de Monsieur Lacan (como é mesmo o primeiro nome dele?) Meu tempo sempre esgota. E monsieur me encerra dizendo que a imagem é engravidada na condição de substituta, digamos, de suplência imaginária do Outro inacessível. Mon Dieu, acho que vou cair...

Encontrar a minha identidade sexual pode ser um longo e difícil caminho. Desejo de todo o coração reconciliar polaridades, permiti-las viver em harmonia e, enfim, começar a fazer minhas verdadeiras escolhas. Enquanto isso vou vivendo e então resolvi escrever esse email pois vivo nessa eterna condição limítrofe. Pareço uma ninfa..."

4 de junho de 2009

Uma vida longa

Encontrei esse pensamento e acredito que diz respeito à um funcionamento recorrente em muitas pessoas.

"Vivi uma vida longa e passei por muitos problemas, muitos dos quais nunca aconteceram."

Mark Twain, escritor