Tempos
atrás atendi uma paciente de 10 anos que, segundo sua mãe, era “muito tímida”.
Suas professoras me alertaram, “ela é muito fechada”. Na verdade, a menina
sofria de mutismo. Mas não era um mutismo em que ocorrem tentativas de comunicação
por gestos ou alguns escassos sons. O mutismo da menina era seletivo. Com
exceção de seu pai e sua mãe, ela nunca havia falado com adultos. Com os
colegas de classe ela interagia, brincava, fazia bagunça em aula. E falava.
Falava muito. A ponto de receber anotações na caderneta endereçadas à mãe.
O
início da análise da menina foi um desafio para mim. Além da recusa em falar,
ela não queria estar ali. Aos poucos, e com muito manejo, a comunicação foi
acontecendo. Certa vez, com a proximidade do Natal, durante a sessão e quase
como um suspiro, ela me diz:
-
Você não sabe o que eu tô pensando.
-Não,
não sei. Mas você pode me falar.
E
ela me pergunta:
-
Você acredita em milagre?
O
que me autorizo a narrar sobre esse atendimento, encerra aqui. Hoje me coloco
frente à essa pergunta e digo: sim, eu acredito em milagre. Mas, sobretudo, acredito
no milagre da superação, na perseverança e no trabalho feito com dedicação e
cuidado.
Acredito
também que nenhuma situação difícil que se esteja atravessando é definitiva. Ou
que seja “coisa do destino”. A vida é dinâmica e é isso que faz dela um grande
milagre.
Desejo
à todos uma noite de Natal muito feliz. E que esse momento de paz e união seja
o milagre de todos os dias.