16 de julho de 2009

Solidão day by day


Existe um contingente que cresce a cada dia formado por pessoas que decidiram morar só e cada qual com seu argumento transformou essa opção em estilo de vida. Aproximadamente 4 milhões de brasileiros decidiram morar sozinhos. Na verdade viver só tornou-se uma tendência mundial e em geral são pessoas independentes que se instalaram em lares confortáveis onde muitas vezes revelam uma autosuficiência operacional e emocional desconcertantes para quem tenta se aproximar, afirmando não gostarem de “problemas”, que é “ótimo viver sozinho e não precisar dar satisfação à ninguém”. Possuem prontamente uma grande lista de vantagens em se ESTAR sozinho em casa. A maioria de ordem prática tais como assistir ao que desejam na televisão, organizar e bagunçar a casa sem ouvir reclamação e a lista continua bastante longa com poucas variações. Mais adiante se começa a perceber um tom um pouco mais triste e preocupante frente à solidão pela ameaça em haver optado por viver só e esse fato tornar-se uma sentença para toda a vida.

SER sozinho é diferente. Há um sentimento angustiante escondido e permanente. Afinal confrontar-se com o próprio silêncio não é muito fácil. Em perceber que o telefone não toca. Ou a possibilidade de escorregar no chuveiro e bater com a cabeça. E a pior de todas. E se eu morrer sozinho??? Para morrer não é necessário um parceiro ao lado, mas perceber a falta de reconhecimento de alguém em sentir a nossa falta traz um sentimento de desvalia difícil de driblar. É o momento em que a auto estima é abalada à elevados níveis.

“...o fato de não ser amado reduz os sentimentos de auto estima, enquanto que o de ser amado os aumenta. ... uma pessoa apaixonada é humilde. Um indivíduo que ama priva-se, por assim dizer, de uma parte de seu narcisismo, que só pode ser substituída pelo amor de outra pessoa por ele. Sob todos esses aspectos, a auto estima parece ficar relacionada com o elemento narcisista do amor.” (Freud, Sobre o Narcisismo, 1914)

Portanto dependemos do outro para nos reconhecermos como indivíduos e nos sentirmos amados. A ausência de interesse em não dividir a vida ou a casa e o excesso de apego material promovem um distanciamento dificultando as relações. Algum sentimento de pesar em datas importantes no calendário e um sentimento de fracasso em ver os amigos do mesmo círculo de amizades constituindo família fazem com que em muitos casos a solidão esteja além de uma escolha pessoal. Pode atrapalhar a vida e cada vez mais dificultar as relações.


10 de julho de 2009

Um breve conto homossexual

Talvez eu devesse explicar de antemão o que se trata aqui. Um email recebido de uma mulher de 32 anos falando sobre suas certezas e, segundo ela, muitas dúvidas acerca de relacionamentos e sexualidade. O nome é fictício e reproduzirei algumas partes do email que me inspirou escrever esse conto.


Joyce, a questão consultada foi enviada para sua caixa postal.
Um abraço.

O email: "Vivi minhas primeiras atrações e desejos na época da adolescência...sonhava com o príncipe...mas me sentia atraída por aqueles que possuíam um aspecto feminino...ou algum traço, jeito...de sacudir os cabelos que me lembrasse uma mulher. Minha primeira experiência sexual com um homem foi um desastre...conheci uma mulher mais velha...me fez a mais linda declaração de amor...debutei em meus amores homossexuais..."

O conto: "Meu nome é Joyce. Tenho 32 anos, vivo nessa eterna condição limítrofe e pareço uma ninfa de mármore em um divisor de águas. Assim... Vivi meus primeiros desejos adolescentes, incandescentes, como toda jovem de minha idade. Sonhava também com o príncipe encantado. Sentia-me, portanto, agitada e muito atraída pelos meninos. Mas percebia que aqueles que me atraíam, tinham algo de feminino, um traço, um sorriso, o jeito de sacudir a cabeça e jogar o cabelo para trás. E essa era a parte que eu mais gostava. A dúvida em saber quem de fato estava ali. Ele ou ela. Menino ou menina. Minha desastrosa primeira experiência sexual foi com um homem bem mais velho. Achei que passaria por esse ritual iniciático e seguiria com a minha vida sem incômodos buscando minha identidade sexual. O outro lado da minha moeda. Terrível. Sem comentários. Mas aos 18 anos uma mulher fez a mais linda declaração de amor que eu havia recebido até aquele momento. Malditas palavras. Ela era diferente. Diferente de mim, de tudo. Sofisticada, tinha um ar de superioridade, algo blasée que escravizava todos nesse olhar. E em meio à uma música hipnótica e círculos de fumaça ela me diria "I'm at heart a gentleman", como Marlene Dietrich. Ali foi o início de meus amores homossexuais.

Hoje entre idas e (bem) vindas e depois de uma ruptura às vésperas do dia dos namorados (e das namoradas!) faço o balanço da minha vida e constato com certo temor que minha identidade é dissociada entre uma parte feminina e outra masculina. Parece que a minha crise de meia idade é precoce. Sim, sim...Tenho ido à um psicanalista. Indicaram um tal de Monsieur Lacan (como é mesmo o primeiro nome dele?) Meu tempo sempre esgota. E monsieur me encerra dizendo que a imagem é engravidada na condição de substituta, digamos, de suplência imaginária do Outro inacessível. Mon Dieu, acho que vou cair...

Encontrar a minha identidade sexual pode ser um longo e difícil caminho. Desejo de todo o coração reconciliar polaridades, permiti-las viver em harmonia e, enfim, começar a fazer minhas verdadeiras escolhas. Enquanto isso vou vivendo e então resolvi escrever esse email pois vivo nessa eterna condição limítrofe. Pareço uma ninfa..."